Pedro Leandro Batista de Souza

 

POSSÍVEIS AÇÕES DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL PARA OS SÍTIOS PRÉ-HISTÓRICOS DE CORGUINHO E AQUIDAUANA COM BASE NO MODELO DO DISTRITO DE PORTO CAIUÁ – NAVIRAÍ – MS

 

 

O presente trabalho tem como objetivo central a apresentação de modelos de educação patrimonial para dois abrigos sob rocha, com materiais arqueológicos e pinturas rupestres, nos municípios de Corguinho e Aquidauana – MS. Estas descobertas, embora casuais, permitiram a construção desse trabalho e empreenderam diversas fases de pesquisa como a visita técnica, o contato com os objetos e pinturas rupestres, análise geográfica dos locais em campo e dos processos burocráticos necessários para que os materiais e os locais naturais usados como moradia por grupos caçadores coletores e ceramistas agricultores se tornem parte do patrimônio cultural de MS, e que estes sejam reconhecidos e protegidos pela União.

 

Possíveis ações de educação patrimonial para os sítios Pré-Históricos de Corguinho e Aquidauana com base no modelo do distrito de Porto Caiuá – Naviraí – MS

O objetivo desse texto é demonstrar ações de educação patrimonial, com base em sítios arqueológicos Pré-Históricos, que possam ser aplicadas nos municípios de Corguinho/Aquidauana. Há no Brasil uma carência significativa no que tange ao patrimônio e práticas efetivas da conscientização das comunidades entrono de locais de história. A partir de 1988 o conceito de Patrimônio irá se ampliar, e mais tarde com o estabelecimento de ferramentas  de preservação ao material e imaterial como também ao que remonta ao processos de inventário e registros, irão encontrar primeiras normativas como o Decreto 3.552 de 04 de agosto de 2000, que implementa ações educativas e ressaltam a importância e a preservação das heranças culturais, essa que projeta aos órgãos então responsáveis a abarcar o desenvolvimento como o atributo da gestão do patrimônio cultural.

 

Com a Lei Federal n°3.924 de 26 de julho de 1961, que já nesse período de voga do pensamento no que tange a reafirmação dos objetos ligado a cultura nacional que irão dar ênfase aos monumentos arqueológicos e pré-históricos, e sobre essa normativa irá regulamentar a guarda e a proteção dos bens. Nessa conjuntura o estudo arqueológico começa a se projetar em relação ao patrimônio.

 

Segundo Magalhães (1981) novas mudanças iriam se iniciar a partir de 1981, com a Secretária de Cultura que a disporia de duas subsecretarias que tratariam de assuntos ligados a cultura e a outra ao patrimônio artístico nacional. A imprensa nesse período já discutia que era necessário criar um Ministério da Cultura, o que também na visão de Magalhães não era viável a divisão nesse período, de cultura e educação, era necessária o incentivo para estreitamento entre as duas.

 

“Por enquanto, em nosso país, não se pode divorciar cultura e educação, mas muito ao contrário, é necessário incentivar o estreitamento das relações entre as duas áreas, em virtude do papel primordial que o processo cultural desempenha no educacional, na medida em que uma educação desprovida do seu contexto sociocultural não passa de mera técnica sem grande utilidade ou a serviço da progressiva perda de identidade nacional. Não há desenvolvimento harmonioso e nem se faz uma nação forte se, na elaboração das políticas econômicas do país, não são levadas em consideração as variáveis culturais e o papel que aí desempenha o sistema educacional”. (MAGALHÃES,1981, p.2).

 

Nessa perspectiva ligar as E.Ps com a educação pode alcançar grandes patamares, apesar da dificuldade de recursos e investimentos na área de educação patrimonial, há possibilidades viáveis de inserção em diversas esferas da comunidade.

 


Figura 1: Diagrama referente ao uso educacional do Patrimônio Cultural Fonte: adaptado de Horta et al., (1999)

 

Então a partir de Horta (1999), verifica-se que essa metodologia incita aos professores a utilizar os próprios objetos culturais, como “Fonte de informação sobre a rede de relações sociais e o contexto em que foi produzido”.  Logo as ações a serem desempenhadas nos locais onde se encontraram tais achados se misturam na amalgama dos objetos culturais nesse caso a arqueologia que resgata não somente o passado, mas também projeta as problemáticas da afirmação do patrimônio a aqueles que são também estão inclusos nos contextos históricos, (comunidades, escolas, municípios, prefeituras).

 

A cultura patrimonial não está somente para elucidar o objeto e nem somente sua apresentação. Ela se insere ao público onde esse estão também aprendendo e adquirindo habilidades relacionadas a salva guarda do patrimônio. Como conceitua Silva (2007), a Educação Patrimonial não empreende de uma simples atividade pedagógica e também não se assemelha a uma disciplina no curriculo escolar.  Em sua abrangêcia detém de uma índole interdisciplinar  integrada a várias areas de conhecimento. E um dos metódos em que a educação patrimonial está inerentemente ligada à Arqueologia.

 

“[...] onde as investigações são feitas em campo, em contato direto com os objetos dando entendimento acerca dos homens e suas cultura, seus artefatos culturais, suas habitações e cercanias, permitindo conhecer o seu passado numa visão diferenciada, mais democática, humana e desalienada da história elitizada” (SILVA, 2007, p.41).

 

É sabido que Arqueologia se projeta em uma área de conhecimento que se utiliza de vestígios materiais como fonte documental, e através dessa, forja entendimentos e concepções sobre a vida de diferentes sociedades, tal se relaciona de modo direto com os ambientes naturais e ecossistemas. Logo o conhecimento arqueológico compõe-se de óticas interdisciplinares, que possibilitam nesse caso, o meio escolar para que assim possam ser desenvolvidas atividades de educação patrimonial, que como discutido, se voltam para a sensibilização de professores e ou alunos sobre o enfoque da proteção e valorização do patrimônio cultural no processo educativo.

 

Dessa perspectiva, em 2016, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) aprovou a Portaria n°137, que prevê as diretrizes de Educação Patrimonial no âmbito do IPHAN e de espaços como Casas patrimoniais.

 

“Art. 3º São diretrizes da Educação Patrimonial:

I - Incentivar a participação social na formulação, implementação e execução das ações educativas, de modo a estimular o protagonismo dos diferentes grupos sociais;

II - Integrar as práticas educativas ao cotidiano, associando os bens culturais aos espaços de vida das pessoas;

III - valorizar o território como espaço educativo, passível de leituras e interpretações por meio de múltiplas estratégias educacionais;

IV - Favorecer as relações de afetividade e estima inerentes à valorização e preservação do patrimônio cultural;

V - Considerar que as práticas educativas e as políticas de preservação estão inseridas num campo de conflito e negociação entre diferentes segmentos, setores e grupos sociais;

VI - Considerar a intersetorialidade das ações educativas, de modo a promover articulações das políticas de preservação e valorização do patrimônio cultural com as de cultura, turismo, meio ambiente, educação, saúde, desenvolvimento urbano e outras áreas correlatas;

VII - incentivar a associação das políticas de patrimônio cultural às ações de sustentabilidade local, regional e nacional;

VIII - considerar patrimônio cultural como tema transversal e interdisciplinar”.

 

A partir desse prisma normativo se observa todas a nuances a qual a cultura patrimonial deve ou possivelmente ocasione aos integrantes a qual se inserem na prática patrimonial. Os achados arqueológicos devem ser socializados com a comunidade por meio das E.Ps e que esse gere a sensibilização tão importante para que se construa a relações do homem social com o patrimônio, ligados intrinsicamente de forma que visem o Material/Natural como parte da história e do cotidiano das pessoas.

 

Esse processo tão esperado, os atores sociais tornar-se-ão multiplicadores da ideia ao sentirem como parte integrante da ação. É necessário destacar que um dos problemas enfrentados hoje em relação a educação patrimonial é a visão ingênua de que ela é a grande salvadora de todos os problemas relacionados à preservação do patrimônio cultural. A educação patrimonial passa a ser um mecanismo capaz de solucionar todas as transformações envolvendo a identidade cultural, a gestão e preservação do patrimônio (SOARES; REMPEL, 2010).

 

Ao que se presume com esse entendimento, a Educação Patrimonial pode/deve ser fomentada e apreendida as comunidades próximas aos sítios arqueológicos descobertos, e assim buscar objetivar nesses locais a sensibilização para como o passado arqueológico e do patrimônio natural local.

 

Possíveis práticas patrimoniais aos sítios de Corguinho e Aquidauana/ baseadas no exemplo bem-sucedido no distrito de Porto Caiuá – Naviraí - MS.

O Museu de Arqueologia da Universidade Federal do Mato Grosso do sul, em seus doze anos de atividade, produziu diversas ações com êxito de Educação Patrimonial com foco na Pré-História de Mato Grosso do Sul.  Dessa forma, recorremos ao museu, para avaliarmos alguma ação patrimonial fosse possível de aplicação aos sítios de Corguinho/Aquidauana, objeto de pesquisa desse trabalho.

 

Logo um local foi suscitado, pelas diversas características que se inserem ao contexto dos achados análogos aos sítios descobertos e pelas ações que foram desempenhadas por uma equipe multidisciplinar. Desse modo foi escolhido para exemplificar as ações de cultura patrimonial o trabalho respectivo a: ÁREA PROJETADA PARA A IMPLANTAÇÃO DO DISTRITO DE PORTO CAIUÁ, Portaria IPHAN nº 48 de 14/10/2013, que tem como instituição responsável o MuArq em parceria com a Fundação de Apoio a Pesquisa, ao Ensino e à Cultura (FAPEC).

 

Esse trabalho em resumo, foi desenvolvido a uma pesquisa referente ao desenvolvimento de um trabalho de consultoria técnico-científica em Arqueologia, atribuído ao instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).  No presente trabalho ocorreram ações de pesquisa para implantação do Distrito de Porto Caiuá, que no contexto abrange o entorno do Sítio arqueológico “Rio Ivinhema 1 (VN1), no município de Naviraí/MS.  O objetivo do trabalho coordenado pelo então Prof. Dr. Gilson Rodolfo Martins (UFMS), consistiu em delimitar na parte arqueológica os locais referentes aos vestígios arqueológicos e seus perímetros, frente a implementação do Distrito proposto “Porto Caiuá”, e que nesse trabalho tinha como fundamental, proteger o Sítio então apresentado.

 

Das diversas etapas desse trabalho, será apresentado aqui as ações de cultura patrimonial que foram desempenhadas em conjunto a comunidade residente ao entorno do sítio INVINHEMA 1(VN1), e que poderão também ser aplicados nos municípios de Corguinho e Aquidauana. As etapas que se sucederam no projeto do Distrito Porto Caiuá, se observou as ações de aplicação da cultura patrimonial. A primeira etapa dessas ações, consistiram em pesquisas preliminares sobre as características dos moradores locais. Foram aplicados questionários simples de forma informal, como conversas descontraídas sobre a disposição dos vestígios arqueológicos, como também se observou o cotidiano da comunidade durante o trâmite do projeto.

 

Posteriormente foi realizado um Levantamento Quantitativo referente as características culturais do Porto Caiuá (MARTINS, 2013). Se desenvolveram entrevistas junto aos moradores, onde foram coletadas diversas informações quanto escolaridade, sobre como se veem e como é a relação com o convívio familiar além de incidência de festas e reuniões. O que chamou a atenção do resultado foi o desconhecimento pela maioria sobre o conceito de sítio arqueológico e sua definição, como também, sobre o patrimônio cultural. Logo se repensou às práticas arqueológicas e foi necessário a apresentação da ciência arqueológica a comunidade.

 

Em referência aos sítios arqueológicos descobertos em Corguinho/Aquidauana, em entrevistas com os moradores locais, se nota que eles demonstraram o desconhecimento sobre as práticas arqueológicas, ademais sobre pintura rupestre e confecção de cerâmica pelos indígenas que habitaram a região. Partindo do modelo de Educação Patrimonial empregado no Projeto Caiuá (MARTINS: 2013), propomos exercícios sobre conceitos como cultura, território, história e Arqueologia em conjunto com os alunos do ensino fundamental na comunidade. Nesse sentido, acreditamos ser importante tratar de: Conceitos de Objeto; Tempo Arqueológico; Evolução da Paisagem; Formação do Sítio Arqueológico (Estratigrafia); Importância do Registro das Peças In loco; Necessidade de não intervenção/ Descaracterização dos Sítios (MARTINS, 2013).

 

Através desses temas os alunos poderão recorrer a dicionários para trabalhar elementos arqueológicos, patrimoniais e Pré-Históricos. No que tange ao exercício individual, trabalhão com questões comparativas como o uso de ferramentas contemporâneas como facas e martelos e depois aos do passado arqueológico (pedra e cerâmica). No exercício coletivo poderá ser abordado a importância de cada peça arqueológica, seu entendimento no contexto sua funcionalidade e sua interpretação arqueológica.

 

Dos recursos para essa atividade poderão ser usadas fotos dos Sítios de Corguinho / Aquidauana através de um quebra-cabeças, o qual poderá ser elaborado com o banco de fotografias do projeto de pesquisa. O exercício em questão objetiva o estímulo e o respeito coletivo, como também das qualidades de cada aluno.

 

Em suma, as descobertas arqueológicas devem ser reveladas para a comunidade por meio da Educação Patrimonial e da sensibilização sobre a relevância da preservação do Patrimônio Natural/Material como parte da história e do cotidiano dos cidadãos. Durante este processo, os atores sociais tornar-se-ão multiplicadores dessa ideia, sendo com que a divulgação da Arqueologia não terá apenas como produto o enriquecimento cultural dos alunos, mas também a apropriação de um conhecimento ambiental. Assim, o desfecho da divulgação da Arqueologia não será apenas como produto a alfabetização cultural, mas também a alfabetização ambiental.

 

Referências biográfica

Pedro Leandro Batista de Souza é licenciado em História pela Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

 

Referências bibliográficas

BRASIL. Lei Federal n°3.924 de 26 de julho de 1961. disponível em: https://legis.senado.leg.br/norma/545756. Acessado em 12/11/2019.

BRASIL. Decreto nº 3.552, de 4 de agosto de 2000 - Publicação Original, disponível em:https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/2000/decreto-3551-4-agosto-2000-359378-publicacaooriginal-1-pe.html. Acessado em 12/11/2019.

 

BRASIL. Portaria nº 137, de 21 de março de 2019. DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, Publicado em: 22/03/2019 Edição: 56 Seção: 1 Página: 23 Órgão: Ministério da Educação/Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior. Disponível em:http://www.in.gov.br/web/guest/materia//asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/68157852/do1-2019-03-22-portaria-n-137-de-21-de-marco-de-2019-68157794

 

HORTA, M. de L. P.; GRUNBERG, E.; MONTEIRO, A. Q. Guia Básico de Educação Patrimonial. Brasília: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional/Museu Imperial, 1999.

 

MAGALHÃES, Aloísio. “As duas vertentes do bem cultural”. Cultura. Ano 10, n°36, 1981.

 

MARTINS, G. R. Projeto arqueológico “Área projetada para a implantação do Distrito de Porto Caiuá”. Trabalho de consultoria científica em Arqueologia. Campo Grande: FAPEC/UFMS, 2013. (não publicado)

 

REMPEL, Anelise Heidi. Reflexos de Santo Amaro do Sul: educação patrimonial e interdisciplinaridade. In: Santo Amaro do Sul: Arqueologia e Educação Patrimonial. Santa Cruz do Sul: Editora da UNISC, 2010.

 

SILVA, Kátia Cilene Camargo. Educação patrimonial: um convite à leitura do patrimônio cultural do município de Anápolis-GO. 111 f., 2007. Dissertação (Mestrado em Gestão do Patrimônio Cultural)- Instituto de Pré-História, Universidade Católica de Goías. Goiânia, 2007.

 

SOARES, André Luis Ramos (org.) et al. Educação Patrimonial: relatos e experiências. Santa Maria: UFSM, 2003.

3 comentários:

  1. Gostaria de saber como ocorreu de fato "a participação social na formulação, implementação e execução das ações educativas, de modo a estimular o protagonismo dos diferentes grupos sociais" previstos pelo IPHAN na normativa de educação patrimonial?
    Pois como pude ler, o autor destaca que as pessoas não dominavam o conceito de sitio arqueológico por exemplo, mas tenho certeza que nominavam o local com algum conceito próprio que lhes diz algo, isso foi agregado no dialogo com os coletivos humanos locais?

    Clarice Bianchezzi

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  2. Olá Clarice, a sua pergunta é muito interessante. Pois bem, para aqueles agentes que se encontravam próximo aos sítios, digo os moradores rurais dos dois locais, estes imaginam que ambos os locais foram ocupados por "índios". Eles de fato não conheciam o termo "sítio arqueológico", apenas chamavam de "caverna rabiscada". O interessante é que a idéia de que aqueles espaços foram ocupados antigamente é presente, eles sabem que aqueles grafismos e pedaços de cerâmicas são antigos. Isso porque muitos já visitavam esses locais em várias fazes da vida. Não foi possível ainda realizar uma atividade de educação patrimonial mais efetiva junto aqueles que residem próximos aos locais. O que conseguimos foi através das conversas informais explicitar sobre a arqueologia e a história da ocupação dos sítios. Espero que os órgãos competentes ou outra instituição dê os pontapés nas pesquisas arqueológicas dos respectivos sítios e ações de cultura patrimonial.

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